Texto por: Luzia Gavina Fotografia: Kristina Paukshtite
Refutando argumentos que defendem a legalização do aborto.
Recentemente a Argentina e a Coreia do Sul conquistaram significativos avanços com relação à legalização do aborto. A polarização da discussão sobre o assunto, de certa forma, apontou um perfil para os grupos a favor e contra a legalização, caracterizando, de um lado, um grupo progressista que busca liberdade e, do outro, um grupo religioso e conservador. Porém, o pensamento contrário à legalização ou descriminalização dessa prática não parte apenas de um entendimento religioso, mas também de uma reflexão de cunho filosófico e sociológico.
Vejamos a seguir alguns dos principais argumentos em defesa da legalização do aborto sendo refutados a partir de uma perspectiva que vai além do pensamento religioso.
“A mulher tem direito de querer ou não ser mãe”
Existem várias opções para evitar uma gravidez, caso a mulher deseje. Temos preservativos, pílula e outros métodos.
Na busca por igualdade de direitos ignoram-se as diferenças físicas, fisiológicas, psicológicas e até antropológicas entre homem e mulher. O fato de a mulher engravidar é visto por muitos como uma desvantagem biológica, logo, o aborto seria um instrumento de liberdade para a mulher, ainda que isso custe a vida de outro ser humano.
A legalização do aborto abre uma porta gigantesca para o entendimento dele como uma ferramenta de planejamento familiar e controle de natalidade. O “direito” da mulher se sobrepõe a qualquer coisa que ameace sua liberdade, ainda que isso custe a vida do seu próprio filho.
“Muitas mulheres morrem em abortos clandestinos”
Em um aborto clandestino, uma mulher e um bebê podem morrer; em um aborto legalizado, uma mulher pode viver e um bebê, morrer. Em ambos os casos alguém morre. Há motivo justo para se matar um bebê indefeso?
Usemos essa mesma lógica para outro tipo de prática: a pedofilia. Assim como o aborto clandestino ocorre em grande escala, a pedofilia também. Já que essa prática acontece de forma deliberada, poderíamos legalizá-la?
O Estado deveria focar seus esforços em promover políticas públicas assistenciais eficazes no acolhimento e acompanhamento terapêutico dessas mães, incentivando e proporcionando um ambiente favorável para a entrega do bebê à adoção, caso a mãe realmente opte por não criá-lo.
Promover a morte nunca será uma solução plausível.
Independentemente da religião, esse argumento fere moralmente nossa humanidade. Defender essa ideia significa valorizar e encarar a morte como opção na tentativa falida de gerar bem-estar para uma mãe que, em muitos casos, está desesperada e sozinha.
“Mas a mulher não tem condições de criar uma criança”
Em alguns períodos da história, as crianças não eram vistas com valor. Sua fragilidade e alta taxa de mortalidade faziam com que o infanticídio fosse algo corriqueiro e às vezes até mesmo desejado devido às necessidades estruturais da família. Nessas épocas a Igreja teve um papel importantíssimo acolhendo bebês indesejados. Eles eram deixados em portas de instituições religiosas, como a Roda dos Expostos da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo entre os séculos XIX e XX.
Hoje uma opção viável para esse tipo de caso, além dos métodos contraceptivos amplamente oferecidos para a população, seria a entrega para a adoção. Uma mulher que vive uma gravidez indesejada pode entregar o seu bebê para adoção no próprio hospital sem ser criminalizada por isso. Essa é uma opção adequada para um caso que envolva falta de condições financeiras. A morte nunca deveria ser encarada como uma opção.
“É só um aglomerado de células”
Quando a gravidez é desejada, chamam de bebê; quando é indesejada, preferem chamar de aglomerado de células. A linguagem tem um grande poder na formação de um pensamento coletivo.
A definição de vida humana foi relativizada a partir do desejo do eu, da vontade própria e da conveniência. Alguns usam esse termo subjetivo para definir quando a vida começa. Para alguns, seria aos três meses, para outros aos seis, e para outros só começa quando nasce. O fato é que mesmo sem ter todas as estruturas físicas e cognitivas formadas, com cinco semanas já ouvimos o coração, com 12, vemos toda a formação de braços, pernas, o bebê boceja e faz até caretas.
Ignorar a vida intrauterina do bebê é uma expressão da intensa desvalorização da vida humana.
“Será um bebê deficiente”
Se o desenvolvimento cognitivo ou neurológico é o parâmetro pra definir o valor de uma vida, como encararemos pessoas com algum tipo de deficiência hoje? Poderemos matá-las também? Esse argumento, apesar de absurdo, tem regido muitos países que permitem o aborto quando a mãe descobre que o filho tem alguma deficiência.
Em algumas nações europeias o aborto pode ser feito caso a mãe não queira um bebê com Síndrome de Down, por exemplo. Estima-se que na Europa, nove entre cada dez mulheres decidem pelo aborto ao serem informadas de que o bebê em seu útero porta a síndrome.
O nome disso é eugenia, só que disfarçada de liberdade. Esse pensamento serviu como base para a a ONG fundada por Margaret Sanger em 1916, que mais tarde se tornou a Planned Parenthood, hoje, a maior clínica de aborto dos EUA.
O entendimento acerca do ser humano ser a imagem e semelhança de Deus, construiu nos países com formação judaico-cristã um reconhecimento da dignidade e valor da vida humana. Esse reconhecimento influenciou nossa forma de pensar ética e moralmente. Não é à toa que, apesar dos muitos desafios sociais, os países que mais se desenvolveram com relação aos Direitos Humanos, são países com esse tipo de formação cultural.
O egocentrismo presente na pós-modernidade promove a desconstrução de toda ideia que o contrarie.
Assim, as bases da sociedade que enxergam o valor da vida humana são desconstruídos, dando espaço a uma falsa liberdade, por meio de um discurso enganoso de compaixão que promete vida, mas gera morte.
“... quando o consenso cristão morre como base de uma cultura, a sociedade não possui bases sobre as quais ela tem possibilidade de construir”. (Francis Schaeffer).
Em um contexto tão decadente de profundo egocentrismo e relativização do valor da
vida, onde o absurdo se torna normal, faz-se necessária uma postura firme que dialogue com
a cultura, porém sem abandonar as verdades eternas que tanto contribuíram para a formação
da sociedade; postura essa que não se resume a um discurso apenas, mas que expressa um
testemunho de vida condizente e que não se acovarda com as pressões desse tempo. Através
dela talvez seja possível desfazer os sofismas e discursos que se levantam contra o
conhecimento de Deus, que é estampado em toda a Sua criação (Rm 1:20); manifestando
assim a justiça que o mundo clama, mas reprime em sua consciência caída.
Luzia Gavina é professora e pedagoga. Casada com Bruno, é mãe do Calebe e do Estevão. Luzia é líder de jovens na Comunidade do Rei em São Gonçalo, Rio de Janeiro.
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