Texto por: Felipe Bartoszewski Foto: Alexandra Fuller
Vivemos em um mundo onde grande parte de nós tem desfrutado de avanços na área da tecnologia e ciência; os quais foram responsáveis por otimizar muitos esforços que, até tempos atrás, eram necessários.
Viajamos de um continente para o outro em questão de horas. Nos conectamos com pessoas do outro lado do mundo por meio de um click; e através desse mesmo click, compramos diversos produtos e alimentos que podem chegar em nosso endereço em questão de minutos.
No que tange à necessidade de esforços físicos, a humanidade nunca desfrutou de uma fase tão confortável. Contudo, vale atentar para o fato de que somos a geração mais sedentária da história, e, consequentemente, a mais doente.
O problema é que uma vida sedentária tem sido tão comum, que muitas pessoas desconhecem os potenciais riscos. Afinal de contas, nunca, de fato, provaram aquilo que podemos chamar de uma “saúde plena”, pois vivem em um mundo onde todos os elementos cooperam para que a saúde não seja uma prioridade.
A ideia aqui é falar sobre saúde, mas não necessariamente a saúde do corpo. Se entendermos que corpo, alma e espírito estão interligados, precisamos reconhecer que, da mesma forma que a geração atual tem decaído de seus parâmetros originais de saúde física, ela está muito aquém de provar uma vida espiritual plena.
Enquanto o inimigo da saúde física é o conforto, o grande elemento comprometedor da saúde espiritual é a superficialidade.
No mundo em que vivemos, pressa é como o oxigênio, que poucos percebem, mas todos respiram o tempo todo. Para termos tudo ao nosso alcance no momento em que queremos e precisamos, tudo precisa ser mais rápido, e a aceleração da vida humana tem roubado a nossa principal virtude: a capacidade de desfrutar da vida. Esse desfrutar inclui refletir, atribuir significado a momentos e pessoas, a buscar olhar cada coisa da forma apropriada.
A superficialidade é tão prejudicial para a nossa espiritualidade quanto o sedentarismo é para nossa saúde física. Por não conseguirmos desfrutar da vida e de cada momento que ela oferece, nos tornamos ávidos em buscar uma nova experiência que nos traga algum tipo de satisfação, não importando quanto de esforço e tempo que isso nos custe. Isso se torna um ciclo vicioso, pois a superficialidade aumenta nossa sede por realização pessoal (prove, coma, toque, ouça, vá, viaje, tenha, conquiste, faça, etc.), e a sede por realização pessoal direcionada para o alvo errado é o caminho mais rápido para crescermos em superficialidade.
Estamos buscando diariamente meios que nos tornem livres dos desafios da vida, e sem perceber, estamos nos tornando escravos incapazes de romper com essas cadeias.
É nesse contexto que as disciplinas espirituais acentuam sua importância para um viver saudável na geração atual. Quando oramos, temos a oportunidade de ouvir a voz de Deus em nosso interior. Ao lermos as Escrituras, recebemos direção sobre como definir nossos passos e perspectivas. O jejum revela nossos reais apetites e dependências; enquanto que a solitude revela o grito da nossa alma ante o medo da solidão. A simplicidade nos conecta ao que é essencial; e por aí vai. Em cada disciplina, somos chamados a um viver intenso, significativo e constante, nos privando assim de que nossa vida seja regulada pelo ritmo desse mundo.
Assim como o exercício físico nos liberta da ditadura do conforto, as disciplinas espirituais nos libertam das correntes da superficialidade.
Isso acontece porque por meio delas, somos convidados a não viver por demanda, a sermos livres da tirania da urgência e assumir um estilo de vida que tenha como alvo a profundidade, e não o acúmulo de realizações. A principal evidência de que as disciplinas estão contra a maré que arrasta a sociedade contemporânea, é o fato de que elas demandam aquilo que quase nenhum de nós está disposto a investir: tempo.
Tempo é tudo o que o mundo atual não deseja perder, e por conta da produtividade a longo prazo nos exercícios espirituais, orar, meditar, jejuar e engajar em outras atividades semelhantes, podem ser vistas como perda de tempo. Mas se aceitarmos investir o tempo necessário em nossa formação espiritual, veremos que as disciplinas espirituais são parte essencial desse processo que tem como objetivo nos libertar de tudo aquilo que nos impede de viver a plenitude do propósito para o qual fomos criados. Portanto, não se trata primeiramente de uma questão de desempenho, mas de prioridade, de compreender o que de fato pode nos libertar da tirania da urgência e da superficialidade do mundo atual.
A constância nas disciplinas espirituais não depende primeiramente da força de vontade daquele que as pratica, mas do lugar de prioridade que cada disciplina ocupa no coração do praticante.
Por exemplo: Se a oração tem pouco valor na sua vida, você nunca vai ter tempo para orar. Mas se as redes sociais têm muito valor em sua vida, você sempre irá criar um tempo para navegar nelas. Mas se a oração tem muito valor em sua vida, você nunca vai ter tempo para ficar sem orar. E se as redes sociais perderam espaço em suas prioridades, talvez em alguns dias não vai dar tempo de acompanhar as últimas noticias que surgem por lá.
Se você já se frustrou fazendo diversos cronogramas de leitura bíblica, oração e jejum, que tal investir tempo em descobrir a importância dessas e outras disciplinas? Se elas se tornarem vitais para você, o exercício forçado se tornará um ato involuntário e natural tanto quanto o respirar.
Pessoas fracas e inconstantes como eu e você podem engajar em uma vida constante de disciplinas espirituais assim como uma pessoa não precisa ser forte para desejar comer e beber todos os dias -- desde que a disciplina seja para a alma o que o alimento é para o corpo.
Felipe Bartoszewski é empresário e fundador da Escriba Couro. Casado com Juliana, é pai da Helena, da Giovana, do João e do Tiago. Serve na Família dos que Creem, em Curitiba, PR.
Que texto necessário pra esse tempo!